A direção da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) divulgou, nesta sexta-feira (30), um informe, que bem poderia se chamar desinforme, para tentar desmobilizar o conjunto dos e das jornalistas da empresa, que aprovaram, por unanimidade, em assembleia, uma paralisação nacional de 24 horas na próxima terça-feira (3), em repúdio ao ataque promovido contra direitos históricos da categoria na formulação do novo Plano de Cargos e Remunerações (PCR), cujos principais pontos não foram negociados com os/as empregados/as e suas entidades.
Temendo o alcance da mobilização, que conta com ampla e crescente adesão, em todos os setores, a EBC aposta na disseminação de informações parciais, imprecisas e descontextualizadas, além de reforçar um discurso que busca dividir os empregados e sufocar uma categoria essencial na prestação do serviço de radiodifusão pública.
Assim como todos os trabalhadores da EBC, os jornalistas querem sim um novo PCR que promova ganhos e melhore a ascensão na carreira, mas isso não pode ser feito às custas de violar o direito à jornada específica da categoria, prevista na Seção XI da CLT desde 1943, ainda com Getúlio Vargas. A mesma CLT que consagrou diversos outros direitos fundamentais dos trabalhadores, vigentes até os dias atuais, e usufruídos por todos os empregados desta empresa.
A falácia do salário-hora
De forma descarada, a EBC insiste na mentalidade de salário-hora, inexistente em outras empresas públicas e privadas, para defender tabelas salariais desiguais e sem isonomia entre carreiras de nível superior. É a forma de atacar a jornada específica dos jornalistas, esvaziando o seu alcance.
As jornadas reduzidas são definidas por lei. Não foram pensadas pelo legislador para firmar uma remuneração menor aos jornalistas e outras categorias que as recebem, como enfermeiros e advogados, por exemplo. Ao contrário: ao admitir um aditivo contratual para aumentar a jornada diária do profissional, a lei determina que essa hora deve ser majorada, conforme o artigo 305 da CLT, o que torna evidente a intenção de definir uma carga horária específica sem que isso represente salário proporcionalmente menor que o de trabalhadores que cumprem 8 horas diariamente. A proposta da empresa tenta usar o PCR para burlar a legislação.
Vale lembrar que o trabalho de jornalista implica uma série de características próprias da profissão, como plantões recorrentes em finais de semana e feriados, atividades externas, coberturas em situações de risco, etc. É inerente ao trabalho do jornalista estar em constante atualização, diariamente, mesmo fora da sua jornada habitual.
Pisos salariais
Para sustentar sua falácia, a empresa compara o piso salarial do novo PCR com o piso salarial do jornalista no setor privado, definido em Convenção Coletiva de Trabalho (CCT). Ora, diversas outras carreiras de nível superior na EBC também possuem pisos salariais da profissão definidos em convenções coletivas com empresas privadas. O piso salarial dos administradores no estado de São Paulo, por exemplo, está atualmente fixado em R$ 3.542,14. Já o piso proposto no PCR da EBC para o analista da mesma carreira é mais do que o dobro, chegando a R$ 7.200.
Em outro caso, o piso salarial do advogado empregado privado, de acordo com a Ordem dos Advogados do Brasil - Seção DF (OAB-DF), está fixado, em 2024, no valor de R$ 5.816,05 para a jornada de até 40 horas semanais. Já o valor oferecido pela EBC, de R$ 7.200 no primeiro nível, é 23% superior para a mesma categoria. Advogados de carreira na EBC, por exemplo, ainda têm direito a honorários advocatícios em processos judiciais, que é uma prerrogativa específica desta carreira, a qual respeitamos, e nem por isso se considera algum tipo de assimetria.
Também poderíamos citar a carreira de contador, que possui pisos salariais que variam de R$ 2.237,19 a R$ 3.184,48, segundo a CCT da categoria, assinada pelo Sindicato de Contabilistas de Brasília com empresas privadas. O valor do piso para analistas desta carreira na EBC - de R$ 7.200 - é mais de 300% superior ao piso básico desses profissionais no mercado privado.
Em síntese, a comparação feita pela empresa, para tentar apontar algum tipo de privilégio para uma carreira, a de jornalista, é facilmente desmontada quando se olha o cenário de outras profissões que também compõem o quadro de analistas da empresa. São profissões que têm diferentes pisos salariais, em valores inferiores e superiores aos de jornalistas. O fato é que a comparação de salários entre os setores público e privado, nesse contexto, é inadequada.
O que as entidades sindicais defendem é o padrão que existe hoje: tabela salarial isonômica entre todos cargos de nível superior da empresa, respeitada as legislações específicas de cada categoria.
Festejamos a valorização conquistada pelos colegas de nível técnico, destacando que esse avanço foi obtido, inclusive, com forte empenho dos sindicatos de jornalistas na mesa do Grupo de Trabalho sobre o PCR.
Falta de diálogo e inverdades
Não é verdade que 50% dos empregados terão aumento de 50% no salário, como informou a EBC, porque não há ninguém no nível inicial em nenhuma carreira na empresa, uma vez que o último concurso foi realizado há mais de 10 anos. Esse percentual valerá apenas para novos concursados. O reenquandramento para quem está em níveis intermediários será percentualmente muito menor do que o reajuste do piso, uma constatação óbvia.
No informe, a empresa alega que haverá “reabertura das discussões” e que nada está definido. A verdade é diferente. A diretoria verbalizou para dirigentes sindicais que não havia negociação em relação ao salário-hora, que estava definido de forma irrevogável pela gestão. Tanto é assim que boa parte do EBC Desinforma é para justificar o salário-hora.
Ao afirmar que pode revisar pontos da proposta, a empresa é irresponsável com o conjunto dos seus empregados, já que havia mandado emails individuais informando a projeção salarial com base na proposta que estava sendo elaborada. Gera nos trabalhadores uma falsa expectativa, em um momento em que nem mesmo as instâncias superiores do governo aprovaram a proposta de forma integral, e em meio a questionamentos legítimos de outras categorias.
Sobre a PJ, a mesma empresa que "garante que não está prevista a redução" é aquela que prepara uma nova norma para restringir o instrumento e facilitar a sua revogação. Não há nenhum tipo de garantia, que só poderia ser efetivada por meio de acordo específico, e não com palavras ao vento.
Por fim, os sindicatos de jornalistas reafirmam a importância da paralisação da categoria, na próxima semana, e a continuidade do nosso movimento, que é justo e legítimo. Esperamos que possa haver espaço real de negociação, sem interdições, e que a empresa pare de jogar seus empregados uns contra os outros.
Sindicatos de Jornalistas DF, SP e RIO
Beatriz Evaristo, jornalista e representante da Comissão dos Empregados DF
Guilherme Neto, jornalista representante da Comissão dos Empregados RJ